Existiam quatro cabines de
alvos, cada uma com três alvos e um avaliador. James e Varis ficaram afastados
um do outro para a avaliação. Foi então que o avaliador do ladino se pôs a
encará-lo.
– Você
pretende arremessar o quê? – Ele o questionou.
Varis
tirou as adagas das bolsas em suas axilas e as mostrou.
–
Desculpe, mas acho que não podemos considerar essas suas adagas. – O homem
interrompeu. – Estamos classificando os alvos por quantidades de arremessos e,
ao que aparenta, você só vai conseguir arremessá-las duas vezes. Fora que, se
puxá-las, pode aproximar os alvos ou alguma outra coisa.
– Hum,
certo... – Varis olhou para suas adagas. – Infelizmente, elas foram feitas e
forjadas pra terem o encaixe das correntes, não tem como tirá-las.
– Sem
problemas. – O anão pegou de dentro de uma das gavetas uma pequena bainha de
couro. Ele a colocou no balcão da cabine e espalhou cinco facas de arremesso. –
Estamos preparados para isso.
– Hum,
curioso... – Varis pegou uma faca e a jogou para cima para se acostumar com o
peso, em seguida, ele pegou mais duas e começou a fazer malabares. – Elas são
leves...
–
Sim... – Respondeu espantado com as ações do ladino.
Rapidamente,
Varis pegou as últimas duas adagas, fazendo um show de circo digno de um
malabarista lendário. Todo aquele espetáculo teve seu fim quando o ladino
franziu os olhos para os alvos e rapidamente coordenou suas mãos para o
arremesso.
A
distância era de vinte metros e o ladino jogou suas adagas em um único
movimento.
Porém,
mesmo com a surpresa do jurado, Varis suspirou quando viu os alvos acetados
todos de forma certeira – três adagas no centro do alvo do meio e duas próximas
ainda na zona.
–
Então, quantos pontos cinco certeiras dão? – Varis perguntou.
–
Bem... – O anão ficou surpreso, ele pegou seu caderno de anotações, carimbo e
lápis. – Cada acerto certeiro é considerado cinquenta pontos... então você
conseguiu duzentos e cinquenta pontos...
– Ótimo.
– Varis assentiu, pegando sua fixa de resultados.
Logo em seguida, se virou para o Arqueiro. – Ei James, como foi?
O
arqueiro se afastou do local de tiro ao alvo e guardou sua arma.
– O
que acha? – Ele perguntou, mostrando seu resultado perfeito para o amigo.
– Boa!
– Varis acenou com a cabeça, direcionando a visão para Edward e Pulu, que
estavam a poucos passos dos dois. – Ei, parece que o cara de roupa de bronze
vai fazer algo.
Pulu
estava quase sacando sua arma – uma cimitarra prateada com detalhes dourados e
com diversos selos em seu punhal, semelhante a uma machete, uma boa espada cutlass.
Foi em um movimento rápido que ele invocou a magia da lâmina afiada, projetando
um corte que seguia seu ângulo.
A
magia percorreu o chão como um pilar de vento espantando tudo a sua volta, até
que atingiu um manequim de testes. O pilar de vento foi contido pelo corpo do
manequim, mas isso ocasionou ventos cortantes que danificavam o manequim.
Quando
Pulu deu um golpe no vento visando atacar o manequim, ele explodiu em uma
manifestação de ar – algo que lembrou as magias de Parysas para Edward, mas bem
inferior.
– Oh!
– Varis e James afirmaram ao ver o potencial dos poderes do pequeno rapaz.
Os
avaliadores que estavam fazendo seu trabalho pararam para bater palmas. O
próprio guardou sua arma envergonhado em meio a glória.
Ele
levou a fixa de resultados para os avaliadores, que anotaram e a carimbaram.
Sorridente, Pulo foi correndo para Edward mostrar seus resultados.
– Olha
o que eu consegui! – Ele falou animadamente. – Duzentos pontos!
–
Duzentos? – Varis e James se olharam.
– Eles
não estão colocando essa categoria de magia num nível grande demais? – Varis
questionou. – Digo, nós não temos poderes mágicos e conseguimos mais que isso.
–
Realmente, é algo para pensar. – James respondeu, impressionado pelos mesmos
motivos.
Edward
trocou algumas palavras com Pulu e reparou que chegou a sua vez de ser
avaliado, ele se virou para a área de tiro ao alvo e identificou Varis.
–
Varis, pode vir aqui? – Perguntou com um tom elevado de voz. – Vou precisar de
sua ajuda para isso.
–
Minha ajuda? – Varis perguntou desconfiado.
– Sim,
pode vir aqui?
– O
que diabos você planeja fazer? – Varis se aproximou.
– Eu
preciso de um alvo para direcionar o Arder de Seus Pecados e ninguém aqui tem
mais pecados do que você. – Edward explicou brevemente. – Você só precisa ficar
numa área meio próxima de mim e depois pode correr para longe, só preciso de
você por uns cinco minutos. – Edward completou enquanto se dirigia ao centro da
área de avaliação. Matheus Freitas: Tudo friamente calculado. Só espero que o
Varis não fique muito tostado...
– Você
tem certeza? – Varis o acompanhou. – É muito pecado para o seu nível...
– Eu
aguento o tranco. – Edward falou de forma confiante, parando no meio da ala de
avaliação. Ele direcionou seu foco para os avaliadores. – Peço apenas um breve
minuto para recitar uma oração.
–
Concedido. – Um dos avaliadores respondeu.
Edward
começou a murmurar as orações de Tac Nyan, enquanto Varis ficava tremendo a
cinco metros de distância. Aos poucos, ficou óbvio o acúmulo de energia santa vinda
de Edward, tais efeitos começaram a deixar Varis ainda mais sério, até que a
magia foi invocada.
A
faísca verde do fogo esmeralda tomou conta do espirito de Edward, que expeliu
sua magia para suas roupas e equipamentos, se tornando um cavaleiro metálico
queimando no fogo vívido da própria magia.
Tal
magia foi o suficiente para explodir tudo a sua volta, o que deu para Varis o
gatilho do medo vindo de dentro de sua alma. Instantaneamente, o ladino se jogou
para trás e fez movimento tão rápido que, sem nem perceber, Pulu tinha se
tornado o seu escudo humano.
O
paladino não deu sequer um passo, ele continuou respirando de forma rítmica,
manipulando as chamas de forma padronizada. Ele as direcionou para os braços,
para a espada, para o escudo e até mesmo para a cota de malha interna, dando a
impressão de uma armadura vazia que estava sendo consumida pelas chamas.
Aquilo
não durou nem cinco minutos direito, mas foi suficiente para garantir os
duzentos e cinquenta pontos do paladino com facilidade.
–
Então eles consideram duzentos e cinquenta o máximo em tudo... – James falou ao
ver a cartela de Pulu e Edward. – Eles separaram em cinco tiros com cinquenta
de peso cada e devem ter um critério próprio para magia...
– Isso
faz pensar o que eles fazem para medir a força.
Todos
ficaram quietos por breves segundos, até que, o grito de um avaliador foi
ouvido.
–
Alguém por favor parem esses dois! Eles não param de adicionar pesos! – quando
os quatro se viraram, “surpreendentemente” viram Aquiles levantando pesos, mas
eram muitos pesos, algo completamente além do anormal.
– A
gente devia fazer algo a respeito, não? – Varis sugeriu sem reação, assim como
o resto dos três.
–
Vocês já conseguiram a pontuação máxima! Não precisam continuar adicionando os
pesos! – O jurado anão falou em desespero com Aquiles e Glans que, a cada
levantamento, colocavam mais um peso.
– Se
tem pesos livres... – Aquiles murmurou, levantando o equivalente a quinhentos
quilos em pesos – Ainda não acabou.
Então eles
olharam para Glans, ele dizia o mesmo, mas com uma cara estourada e focada,
assim como Aquiles.
– Isso
é normal? – Pulu perguntou impressionado.
–
Digamos que sim... – James respondeu, tentando deixar seu rosto vazio, mas que
mostrava um pouco de vergonha ao ver essa cena.
Após
uma gritaria desnecessária e de Aquiles fazer mais algumas cenas, os seis se reuniram.
–
Então? – Edward saudou os amigos.
–
Duzentos e cinquenta! – Aquiles afirmou orgulhoso, exibindo sua ficha junto de
Glans.
– Não
é muito uma surpresa. – Varis falou em tom neutro.
–
Obrigado! – Glans flexionou seus músculos, imitando Aquiles.
– Não
foi bem um elogio.
– Bem,
acho que podemos fazer o que realmente interessa aqui. – Aquiles apontou para a
ala de teste de resistência. – Nós seis na corrida!
–
Aquiles. – Edward interrompeu. – Eles só aceitam quatro de uma vez.
–
Droga! – Aquiles e Glans xingaram com decepção.
–
Ah.... – Pulu olhou para o elfo exibicionista e o draconato gigante, depois se
virou e disse. – Eu vou tentar o tiro ao alvo... boa sorte aí.
Pulu
correu rapidamente para longe, dando apenas um tapa em Edward e Varis de encorajamento.
– Acho
que Glans deixar essa passar. – Glans disse de forma intelectual. – Se Glans
correr como Glans está agora, Glans correrá impulsivamente para frente e não
conseguirá fazer as curvas... Matheus Freitas: Glans ser Glans porque somente
Glans é infinito, Glans ser o maior... Sonho em ver o Glans falando
direito...
– Por que
o Glans, depois de malhar, lembra o Varis falando sobre um assunto aleatório? –
James comentou rapidamente.
– O
que você quis dizer com isso? – Varis questionou incomodado.
– Os
dois falam coisas que fazem o total sentido ou que, são complexas demais para a
curva de inteligência que todos esperam.
–
Espera, o quê?! – O ladino reclamou ainda mais incomodado.
–
Glans vai esperar com Voltten e Mulher estranha. – O draconato falou,
suspirando e respirando lentamente. – Depois ir no teste de corrida, boa sorte.
Com
menos duas pessoas, os quatro já se preparavam para o próximo teste. Edward,
assim como Aquiles, tirou sua armadura pesada e cota de malha, ficando apenas
com a veste de pano, James e Varis continuaram com as suas armaduras de couro,
guardando apenas suas armas.
–
Muito bem... – James se alongou. – Pelo que eu vi, cada volta equivale a cem
metros, a cada dez voltas, temos cinquenta pontos.... Logo, são cinquenta
voltas para duzentos e cinquenta metros.
– Isso
são cinco quilômetros... – Varis falou, também se alongando.
– Sem
paradas, sem diminuir o ritmo, direto como eu gosto – Aquiles começou a rir.
Enquanto
os quatro iam para o começo da pista circular, Glans se deitou próximo a
Voltten e Faufautua que observavam seus amigos realizando os testes.
– Hum,
eu queria fazer umas perguntas para você, Faufautua. – Voltten iniciou a
conversa de forma envergonhada.
– Você
é um mago ou pesquisador que quer saber sobre a história de uma ex-deusa? – Faufautua
comentou de forma folgada. – Que original...
Voltten
ficou quieto com receio.
–
Relaxa, eu estou acostumada com esse tipo. – Ela ironizou, pegando um cantil de
metal e bebendo um gole, depois ela estendeu o cantil para Voltten. – Quer?
Ele
hesitou um pouco, mas pegou o cantil e bebeu um pequeno gole, sentindo o álcool
queimando sua garganta como carvão envolto em lava.
Voltten
tossiu um pouco enquanto devolvia o cantil para Faufautua, que se matava de
rir. A ex-deusa guardou o cantil e bateu nas costas do elfo loiro de forma
amigável.
–
Adoro fazer isso, ninguém aguenta esse porre. – Ela ainda ria com alegria. –
Mas e aí, o que quer saber?
– Hum?
– Voltten se recompôs. – Bem, “o que você é?” Eu acho...
– Socialmente,
eu me enquadro como uma ferreira imortal solteirona que cuida de uma família
que hoje se resume a um garoto de vinte e um anos. – Ela respondeu. – Ah, eu
possuo um terço do meu poder divino original e costelas de raiz.
–
Ah... o que seria “um terço do poder original divino” e “costelas de raiz”? –
Voltten questionou intrigado com quase tudo que ela falou.
– Bem,
arrancaram minhas costelas e um ser santo colocou raízes no lugar e cicatrizou
meus ferimentos. – Faufautua riu de forma depressiva enquanto bebia do cantil.
– Nunca descobri quem é esse cara ou garota, mas ele ou ela tinha uma armadura
vermelha rasgada, tipo a do Caçador, embora possa ser um delírio.
– Eu duvido
que ele exista de verdade. – Voltten retrucou.
– É
bom esse desgraçado existir, perdi tudo por culpa dele.
– Entendo...
– Não,
você é um elfo normal, não sabe o que é criar uma comunidade e tribos que te
cultuavam porque você era útil... – Ela olhou para o horizonte. – E depois que
uma grande ameaça se aproximou e você não foi o suficiente, eles decidiram usar
de sua alma divina como arma e de partes de seu corpo como molde.
– Eles
arrancaram sua alma divina? – Voltten perguntou com espanto.
– Dois
terços dela, eu consegui manter um pouco comigo. – Ela riu de forma vazia. –
Você sabe como funciona almas dos deuses, garoto?
–
Ah... um pouco.
– Já
esperava, pelo que o Pulu e Aquiles disseram. – Faufautua respondeu um pouco
mais animada. – Existiam cinquenta deuses, cada um tinha uma alma divina que
faziam coisas distintas.
Voltten
ficou em silêncio, se focando completamente em Faufautua.
– Uma
alma de deus pode ser dividida pelo próprio deus, que escolhe as porcentagens
que quer compartilhar com outro ser, claro que, com isso, o deus deixa de ser deus.
– Faufautua riu de forma irônica. – Acho que ficou claro que isso também pode
ser feito de forma forçada.
– Os
panteões e magias santas, quando os deuses morrem, as magias ficam impossíveis
de se invocar, certo?
– Em
parte, apenas as pessoas que possuem partes da alma do deus podem usar depois
que ela é repartida, por isso que eu posso criar selos. – Faufautua olhou para
suas mãos cobertas por luvas.
– Uma
pergunta, o que seriam as reencarnações, como no caso de Tac Nyan? – Voltten
questionou com grande curiosidade.
–
Quando um deus foge para um outro plano, ele abandona o avatar que estava usando,
quando decide voltar, ele não escolhe quem vai ser seu novo avatar ou até mesmo
quantos vão ser. – Faufautua olhou para Voltten. – Mas dizem que há alguns
fatores que os une, mas são infinitas variáveis. Os avatares divinos podem
nunca se encontrar, dependendo do poder que a alma dá a eles, eles podem ser
lendas em suas regiões.
–
Entendo...
–
Aliás, uma pergunta. – Faufautua interrompeu os pensamentos de Voltten. – O que
planejam fazer com os seis reunidos?
– Você
até sabe a quantidade... – Voltten não pôde negar que teve um déjà vu da mesma
pergunta feita por Pur em Suma.
– Vocês
têm noção de que se um morrer a energia dele vai passar para os outros cinco e
assim sucessivamente até Tac Nyan reencarnar por completo, certo?
Voltten
escutou aquilo com receio, sem palavras para descrever essa descoberta.
– Aliás,
Civitas é aliada de Artit e dos Cavaleiros Negros, vocês não tinham uma mega
equipe de soldados para sequestrar facilmente a princesa? – Faufautua se perdeu
um pouco nas palavras. – Digo, vocês são bons, mas não teria algo me...
Quando
a mulher olhou para Voltten, ela conseguiu ver a mais pura expressão de pânico tentando
ser escondido.
–
Vocês estão sendo ameaçados, certo? – Ela questionou.
– Sim.
– Voltten confirmou depois de uma pequena hesitação.
– Quem
são?
–
Demônios, todos eles.
– Eles
estão esperando vocês reunirem os seis em um único lugar para eliminá-los de
uma única vez...
–
Sim...
Faufautua
e Voltten se encararam de forma nervosa, mesmo que a mulher não tivesse nada a
ver com relação a Tac Nyan, ela entendia em parte o quão nervoso o mago estava.
– Eles
estão a nos usar? – Glans perguntou, interrompendo os dois.
–
Argel, Ortros, Parysas, até mesmo Sansa... eles sabiam que todos os escolhidos
alguma hora vão morrer até restar um e não falaram para evitar pânico... –
Voltten ficou sem expressão, sentado olhando para seus pés com as mãos trêmulas.
– Todo esse trabalho, todo vínculo, tanta coisa... para no fim, sermos apenas
uma ferramenta de busca mais discreta.... Se os demônios não tivessem atacando
eles poderiam ter enviado Cérbero ou outras pessoas...
Quando
vieram as vozes de comemoração dos amigos no teste de resistência, Voltten
terminou seu lamento com essas tristes palavras.
–
Somos inúteis.
– Hum?
– Faufautua olhou para a face pálida do elfo. – Ei Voltten, você está bem? – Ela
sacudiu o elfo, que não reagiu, apenas caindo para o lado duro depois de
desmaiar..