Era meio dia e Mira ainda dormia.
Najla percebeu que algo estava estranho e tentou acordar a amiga, percebeu que
ela suava frio e parecia pálida. Passou um bom tempo tentado descobrir o que a
amiga tinha, mas não conseguiu nada e começou a se preocupar com a
possibilidade de aquilo ter sido a mesma coisa que havia atingido Reyny Erix.
A clériga remoía essa questão com
Bolton e Aron quando Zanshow e Meia-noite chegaram.
— Adivinhem só! — O humano se
aproximou animado, sem perceber o clima no albergue.
— O que foi? — Najla resmungou.
— Eita! Calma lá, por que essas
caras?
Zanshow olhou para o humano e
depois para os três companheiros sentados. Coçou a cabeça e foi se sentar,
tirando a katana da bainha para lustrá-la.
— É a Mira. — Bolton disse, com
aparência cansada.
Meia-noite reparou na maga
dormindo.
— Ela não acordou hoje?
Como resposta ele recebeu abanos
de cabeça.
— Agora minha notícia nem parece
grande coisa. — O feiticeiro cruzou os braços. — Fiquei sabendo que o bebê é
filho do Reyny.
— O quê? — Aron se inclinou
rapidamente para a frente.
— Precisamos voltar lá — disse
Bolton, ele apoiou o queixo em uma das mãos e franziu o cenho.
— Voltar onde?
— No templo que achamos ontem.
— Templo de onde companheiros
quase não votaram vivos. — Zanshow agora prestava atenção.
— Sim, grandão, mas com o estado
da Mira... talvez aquele seja o único lugar onde vamos conseguir respostas.
— Dessa vez Zanshow estar
protegendo amigos. Ninguém se machucar.
— O que estamos esperando? —
Meia-noite já estava de pé.
***
Fazendo o mesmo trajeto do dia
anterior, o grupo, agora maior, entrou no templo e seguiu para o salão onde
tinham visto o corpo de Reyny, assim que entraram uma voz familiar os saudou.
— Ora, ora, temos mais companhia
hoje.
Surpresa Najla reconheceu o morto
vivo que tinha matado a menos de 24 horas.
— Najla... você não disse que
tinha acabado com ele? — Aron deu um passo para trás levando a mão ao arco.
— E acabei...
— Lamento desapontá-la, querida.
— Na verdade, é bom que esteja
vivo de novo, talvez dessa vez seja mais sensato e nos conte o que estão
planejando.
— Nãããã....
— Olhe, uma amiga nossa está
doente, provavelmente a mesma coisa que aconteceu ao mauricinho que vocês
pegaram. Vamos lá, me leve até o seu líder e a gente faz vocês cooperarem.
— Meu líder? Ó não, não, não. Meu
mestre não precisa perder tempo com vocês. No entanto — O morto-vivo cruzou os
braços e coçou o queixo teatralmente. —, a doença da sua amiguinha se trata da
Maldição do Lorde, uma doença transmitida por mortos-vivos conhecidos como
Lordes-Zumbi através do ar.
— Como sabe disso? — Meia-Noite
se adiantou.
— Ora essa, porque ela se
infectou ao lutar contra nós no cemitério.
— Ah... faz sentido...
— E como tratamos isso? — Aron se
pôs ao lado de Najla.
— Que interessante. Parece que
seremos todos amiguinhos então.
— Homem morto estar forçando a
barra. — Zanshow pôs a mão na Katana.
— Tudo bem, tudo bem. Uma pena...
— Ele fingiu estar deprimido para depois abrir um sorriso para a clériga do
grupo. — Mas antes de eu contar algo, você fará um juramento no altar de
Tenebra, de que jamais se intrometerá novamente nos meus planos, nem mesmo
permitir que seus companheiros o façam, sob pena de ser amaldiçoada pela
própria Deusa.
Najla sentiu um puxão na capa,
olhou para baixo e viu Bolton pedindo para que ela ajoelhasse. Revirou os olhos
e se ajoelhou ao lado do halfling.
— Isso não é uma boa ideia —
sussurrou ele.
— Não precisava dizer. Mas eu
confio na minha deusa, e essa é a forma que temos de ajudar Mira.
Ela foi até o altar de Tenebra
enquanto o grupo esperava, receoso. Quando voltou ao seu lugar o morto-vivo
bateu palmas.
— Muito bem, muito bem. Minha vez
de cumprir o trato. — Ele começou a andar de um lado para o outro. — Vamos
ver... vocês tem três alternativas.
Ele levantou um dedo enquanto
caminhava.
— Chamar por Khassawidi
al-Muskati, sacerdote de Azgher, o Deus-Sol, ele é conhecido por dominar
técnicas de cura desconhecidas até mesmo pelas mais poderosas sacerdotisas da
deusa da vida, Lena. — Levantou mais um dedo. — Viajar a Abbathor e procurar
por Tex, o Paladino de Anilatir, a deusa menor da inspiração, dizem que ele
sempre dá um jeito de conseguir aquilo que quer.
Ele parou de andar ao levantar o
terceiro dedo, pôs um sorriso estranho no rosto e continuou:
— Ou a alternativa mais rápida. Solicitar
a ajuda de um halfling druida de Megalokk, o Deus dos Monstros, que vive no
subterrâneo de Thanagard...
***
O grupo passou todo o caminho de
volta para Thanagard discutindo, pararam em uma taverna enquanto ainda tentavam
decidir.
O tempo passou até que uma
notícia se espalhou, pegando-os de surpresa.
Reyny Erix havia retornado à
mansão de sua família há poucas horas.
Os aventureiros se entreolharam e
decidiram por adiar a escolha, precisavam fazer uma visita aos Erix.
***
Denea Erix estava radiante, pois
tinha seu filho em seus braços novamente. Atendeu o grupo com um sorriso no rosto
e os convidou para entrar.
— Senhora Erix, será que
poderíamos ver o seu filho? — Bolton disse, ao segurar gentilmente a mão da
dama.
— Claro que sim, vou chamá-lo
agora mesmo. Ele está tão feliz com a atenção que vem recebendo. Entendam, ele
é um jovem gentil e carente de atenção.
Ela se retirou, dando risadinhas.
Pouco depois a figura de Reyny
desceu as escadas, não parecia muito à vontade, mas forçou um sorriso para
aqueles convidados inusitados.
— Olá... hmmm... senhora e senhores.
— Senhor Erix, desculpe se
ficarmos um pouco desconfiados de que você possa ser um morto-vivo. Afinal nós
batalhamos contra alguns deles tentando proteger o seu corpo. — Najla se forçou
a ser sociável.
— Ah, então foram vocês que
salvaram o meu filho!
— Sim.
— Bem, o que me lembro é que
voltei dos mortos com uma visão do meu filho, senhorita. Creio que foi uma
grande dadiva de Thyatis. O grandioso Deus Fênix!
Najla olhou fundo nos olhos do
homem, era ele mesmo ali, não se tratava
de um morto-vivo, não havia mentira nas palavras dele, embora ele parecesse
bastante assustado por ter sofrido uma epifania.
A clériga sabia que pessoas
ressuscitadas através de Clérigos de Thyatis, o Deus da Ressurreição e da
Profecia, costumavam ter visões após voltarem do mundo dos mortos, e que essas
visões costumam ser tarefas importantes que a pessoa estava destinada a
realizar, mas fora interrompida por uma morte inconveniente. Se Reyny Erix dizia
que tinha visto o próprio filho, ela não via motivos de duvidar daquilo.
No entanto, enquanto seguia o
grupo para fora da mansão, ela se perguntava se realmente um clérigo de Thyatis
havia aparecido naquela cidade, até que se distraiu pelo assunto do grupo.
— Vamos atrás do paladino Tex, é
claro. Deve ser um homem de espirito forte e por isso sempre consegue aquilo
que quer! — Bolton, montado em sua loba, enchia o peito ao falar como se
conhecesse todos os paladinos do mundo.
Najla pensou em Anilatir, a deusa da inspiração não costumava ter paladinos e ela se perguntou como um deles seria. Ainda assim, eles estavam ficando sem tempo. Era melhor não continuar aquela discussão e irem logo para Abbathor... assim que achassem um mapa.