A mulher abriu a porta corrediça
da sala, onde Doji Haruki estava escrevendo em um pergaminho, focado no que
estava fazendo e não deu muita atenção até que ela falou tão baixo quanto um
sussurro que havia nos trazido à sua presença. Ela não queria, de maneira
nenhuma, interromper o que seu Senhor estava fazendo, então ela ficou ajoelhada
ao lado da porta corrediça com as mãos
apoiadas uma sobre a outra nas pernas dobradas, mantendo-se serena o tempo
inteiro; esperando por uma resposta que custou a vir, mas ela não estava
incomodada. Como serva, forçar atenção ao seu senhor era impensável. Haruki
continuou escrevendo até que notou a presença da mulher e ergueu os olhos para
nos ver.
Ele fez um sinal para que
entrássemos, ela curvou-se, esperou até que todos passassem pela porta e a
fechou silenciosamente. Nós quatro nos aproximamos da mesa e ficamos de joelhos
esperando que ele tirasse a atenção dos papéis e olhasse diretamente para nós,
pois essa era a atitude que se esperava
diante de um lorde. Estrangeiros podem achar isso estranho, mas é uma simples
questão de Etiqueta que todos deveríamos seguir. Diante de alguém com uma
posição social maior que a sua, como um professor ou um nobre, tratá-lo com o
devido respeito é o mais apropriado. Não se trata de uma questão de força, eu
mesmo poderia dar fim a vida daquele homem se assim fosse necessário, trata-se
de uma questão de respeito.
Haruki passou os olhos por cada um de nós, aparentemente medindo as
nossas capacidades e julgando se estaríamos hábitos a fazer o que seria pedido.
Ele precisaria, antes de mais nada, de pessoas confiáveis, e ninguém era mais
inconfiável para qualquer um como um Escorpião. Quando seus olhos inquisidores
caíram sobre mim, notei aquele costumeiro brilho de desconfiança que qualquer
Escorpião que se preze deveria provocar em outrem. Continuei olhando fixamente
para ele, até que seus olhos desviaram novamente para o Leão, dando-lhe a
palavra.
―
Haruki-sama, nós trazemos notícias que podem não o agradar. - o Leão falou
firme – Os seus guardas parecem estar envolvidos, de alguma forma, com o roubo.
― Como ousa
acusar um dos meus?! – Sua expressão mudou totalmente para fúria quando ouviu a
notícia. Era impensável, para ele, tal
acusação, nenhum dos que trabalhavam para ele poderiam traí-lo. Assim o Garça
pensava, mas isso seria verdade? Qualquer um pode ser hábito à traição, este só
necessita de um motivo para fazê-lo.
― Ainda não
há nenhuma certeza disso, mas os dois que estão no posto da vigia estão
claramente acobertando Hoen, que saiu depois de falar com a ladra. – eu falei
calmamente para ele – A ladra pode tê-lo enganado de alguma forma, mas ainda
não temos nenhuma prova do envolvimento de nenhum deles.
― Isto é um
absurdo! – ele passou a mão na testa – Meus próprios homens podem estar
envolvidos...
― Ninguém,
além de nós, sabe sobre o roubo, meu senhor. – o Leão falou – É possível que
eles tenham sido enganados pela ardil mulher.
Escutando
isso, Doji Haruki pareceu acalmar-se mais. Realmente, havia a possibilidade de
seus homens terem sido enganados, mas para mim, pelo menos alguns deles
poderiam estar diretamente envolvidos no roubo. Apenas os motivos em intrigavam, porém. Passou-me pela cabeça que o
roubo poderia ser premeditado por um motivo mais pessoal, como uma vingança.
Alguém poderia estar realmente muito irritado com Doji Haruki, por algum motivo,
e resolveu prejudica-lo na frente de Seppun Ayumu. Se Haruki não tivesse mais o
presente que lhe foi dado pelo Lorde dos Seppun, então aquele cairia em
desgraça pela vergonha de tal ato vergonhoso.
― Esses são
os papéis de viagem para vocês poderem atravessar essas terras e irem até
aquele crápula de Samano! – Doij Haruki falou áspero quando citou seu velho
inimigo – Mandei deixar prontos, quatro cavalos para vocês e já devem estar
prontos a essa altura.
Com os
papéis de viagens em mãos, não demorou muito para ficarmos prontos para ir à Wachimasu.
Akodo Ryuu e Hida Hiato vestiram suas armaduras, eram belas peças forjadas para
proteger em batalha, mas a do Caranguejo parecia muito mais robusta e pesada,
em teoria para melhor resistir às criaturas que atacam diariamente a Muralha do
Carpinteiro. O Caranguejo colocou sua katana na obi e um enorme machado duplo
em suas costas.
O Leão era
mais simples em sua escolha de armas, usando apenas uma katana. Não haviam muitos adornos em sua espada ou
na bainha; para os Leões, espadas eram objetos feitos para matar e nada mais. A
única beleza que elas precisavam era o fio e o brilho do bom cuidado com a
arma. Falhar em cuidar da própria espada era falhar com o seu próprio senhor.
Minha mãe vivia me forçando a lembrar de vários desses ensinamentos, de forma
que eles foram ficando impregnados em mim e os levo para a vida até hoje,
apenas alguns deles, é claro.
Agora que me recordo, talvez seja um bom momento
para falar sobre o uso da daisho para os Samurais, e que fique bem claro que
não são todos os que a utilizam; uma daisho eu quero dizer. Para a sociedade
Rokugani, levar uma katana à cintura significa que o Samurai se acha competente
o bastante para defender-se em combate, como em um duelo por exemplo. Em sua
maioria são bushis, homens e mulheres que dedicaram corpo e alma ao caminho do
Guerreiro. Aqueles que usam apenas a wakizashi, são normalmente aqueles ligados
aos kami e/ou defender-se em situações onde as maiores armas são as palavras.
Cortesões e shugenjas são aqueles que usam apenas wakizashi.
Não é uma regra, por assim dizer, muitos usam uma
daisho, não há nenhum problema com isso. Um Samurai ou uma Samurai-ko podem ser
encontrados portando uma. Para aqueles mais entendidos isso vai implicar que o
indivíduo em questão, pode defender-se em embates, sejam estes políticos ou
corporais. Falarei mais sobre o duelo em outra hora, talvez esse não seja o seu
interesse atual, então não seria justo eu começar a indagar sobre o assunto.
Kuni Karasu
conferiu uma bolsa onde haviam vários rolos de pergaminhos, ele tinha algumas
magias gravadas em sua mente, mas, a maioria, ele necessitava daqueles pergaminhos para invocar o auxílio dos kamis e
transformar o favor em magia. Depois de ver que tudo estava em ordem, ele
pegou seu bastão de madeira e foi o primeiro a deixar a sala em silêncio.
Vestindo-me
com minha ashigaru, uma armadura bem leve, protegia tanto quanto uma camisa no
peito, mas haviam proteções nos braços e nas pernas. Era de fato uma armadura muito simples, mas para pessoas ágeis, que não
dependiam tanto da força nos braços como eu, era a melhor escolha, pois
facilitava a locomoção em batalha. Perceba, ela ser tão leve era um problema
quando eu era acertado, mas eu ficaria muito menos cansado de usá-la por mais
tempo do que se usasse uma pesada armadura de batalha, como Ryu e Hiato usavam.
Abri minha bagagem com cuidado e verifiquei tudo ali, não havia como não notar
o pesado olhar de Hida Hiato sobre minha bolsa.
Aquele homem deve ter ouvido muitas histórias
sobre meu Clã, e de canto de olho eu notei um suspiro aliviado. Era como
imaginei, as pessoas que não tinham convívio com o meu Clã tinham ouvido as
coisas mais estranhas sobre Nós, mas isso, no Nosso ponto de vista, era algo
muito bom. Segurei um riso e fui pegando certos
acessórios; nas minhas roupas havia muitos espaços escondidos onde eu guardava
aquilo que não queria mostrar a ninguém. Afinal seria um grande problema ser
visto com elas. Coloquei algumas ferramentas nesses bolsos; discos metálicos
com protuberâncias afiadas, esferas de arremesso frágeis, frascos com substâncias
viscosas e mais algumas coisas. Eu
poderia passar horas falando das coisas que estava levando e as coisas que
deixei para trás, mas não quero deixar esta conversa tão entediante para você.
Retirei minhas
duas lâminas das bainhas, coloquei uma sobre as coxas, conferi o fio de uma e
enquanto fazia isso, ouvi alguns passos pesados vindo em minha direção. Vi
Akodo Ryu me olhando com um sorriso, ele parecia com um pouco de pena, enquanto
olhava a estranha espada em minhas mãos. Estranhas porque o comum, falando de
katanas e wakizashis era ter uma pequena curvatura pela extensão da lâmina, mas
estas espadas não a tinham. Elas eram retas, eram mais leves e infelizmente não
de um material tão bom quanto eram feitas as katanas.
Nós Atores
podemos de fato usar espadas, mas temos que ter um certo grau de desapego com
elas. Armas quebram, entortam, se perdem ou até mesmo nos mais infrequentes
casos, como o de Doji Haruki, são roubadas. O Clã escorpião é rico, podendo
facilmente ser colocado entre os mais ricos do Império, mas não vamos ficar
gastando tanto dinheiro em armas que podem ser descartadas. Eu gostaria de fato
de ter uma Lâmina Kaiu, inquebrável, dar-me-ia até orgulho de ter uma, mas dificilmente
um Caranguejo venderia uma a um Escorpião ou a qualquer outro Clã, mas aos
Escorpiões ele teria muito mais cuidado.
― Você
arrumou um péssimo ferreiro para fazer essas espadas, meu caro – ele olhava
para o aço.
― De fato,
mas o pobre menino era apenas um aprendiz – ri, entregando a que tinha na mão e
fui conferindo o fio da outra – Ele me presenteou com essas lâminas.
Ele ainda olhava estranho para a espada. Eu tinha
deixado ela muito bem adornada para não chamar tanta atenção. Você pode achar
estranho eu não querer tanta atenção, afinal, eu sou um Ator. De fato, atores
gostam de atenção, não sei dizer se são todas as pessoas, mas a maioria, gosta
de atenção. Para as minhas armas, no entanto, eu não quero atenção. Assim como
os Leões e os Caranguejos, eu entendo que armas não são feitas para esbanjar
beleza, armas são feitas para matar. Apesar de já ter visto muitas armas de
enfeite nas cortes, eu não consigo gostar muito delas, mas este é outro assunto
para não ser tratado agora, ou será enfadonho.
O Leão desferiu um golpe no ar para testar o
balanço, sua expressão passou de intriga para espanto. Essa arma tinha um bom
balanço, e por ser tão leve, era ainda mais fácil de balança-la que uma
wakizashi comum.
― Realmente
uma arma intrigante. À primeira vista esta espada é bem ruim, mas é muito bem
balanceada – ele disse, enquanto colocava-as em meu obi – mas eu evitaria usar
uma, pois ela parece fácil de quebrar.
― De fato –
eu suspirei – o rapaz pediu que eu a testasse e me disse-se minha opinião sobre
elas.
― Conhecido
seu? – Akodo perguntou.
―
Sobrinho – eu disse com um sorriso – Ele
ainda tem um longo caminho antes de se tornar um bom ferreiro.
Aquilo era
uma mentira, as espadas não estavam erradas e muito menos foram feitas por meu
sobrinho, que nem mesmo existia. Aquelas armas foram projetadas para serem
descartáveis. Infinitamente mais baratas que uma espada comum. Algumas pessoas
poderiam me trazer problemas se descobrissem sobre a existência dessas armas,
mas eu não me preocupava com aquilo. As que eu usava eram extremamente
parecidas com wakizashis, tirando a forja malfeita. Elas, de fato, quebrariam
facilmente se um golpe muito poderoso fosse aplicado, mas nas mãos de alguém
hábil que sabia o quanto de força poderia colocar sem quebra-las, elas durariam
a vida toda.
Quando
saímos da mansão, encontramos os cavalos assim como Haruki havia dito, montamos
e partimos, imediatamente, ao portão. Akodo Ryu desceu da montaria quando ali
chegamos para conferir aonde os rastros levavam. Como nenhum de nós era um bom
rastreador e ainda havia o problema da escuridão, foi preciso que todos
desmontássemos para encontrar o rastro, e depois de algum tempo, o Leão
levantou a mão nos chamando.
― A trilha
parece que entra na floresta – Ele falou, afastando alguns galhos que parecem
ter sido cortados recentemente.
― Estranho
– eu falei, verificando os cortes nos arbustos – A mulher saiu a cavalo
Akodo-san, não haveriam motivos para ela descer do cavalo e abrir caminho.
― Você acha
que essa pode ser uma trilha para nos distrair? – Kuni Karasu falou atrás de
mim, ele puxava o cavalo pela rédea, mas o mantinha o mais longe que conseguia
de si.
― Talvez. Um
guarda sumiu após falar com a mulher, então ele pode ter sido o autor dessa
trilha. – Respondendo à pergunta de Karasu, eu me virei para a trilha – Nós
deveríamos seguir logo para Washimazu e esquecer essa trilha, mas corre o risco
de perdermos o rastro dela se a mulher tiver realmente entrado naquela floresta.
Eu,
obviamente, não tinha certeza que aquela trilha era falsa, mas tudo o que
encontramos até agora apontava para isso.
Subindo nos cavalos, nós partimos rapidamente para a próxima vila. A
estrada até lá foi bem tranquila, chegamos lá uma hora depois, bem em tempo de
ouvirmos uma gritaria e um claro som de batalha. O Leão foi o primeiro que
sentiu o cheiro de sangue no ar, acostumado com as batalhas travadas por seu
Clã, ele, basicamente, podia sentir de longe que havia uma batalha e começou a
cavalgar mais rápido. Karasu não gostava muito de cavalos, eles eram sujos e
seu incômodo passava para o animal que também se sentia incomodado com o homem,
proporcionando uma cavalgada péssima.
Nós
chegamos bem em tempo de ver vários Caranguejos lutando contra um batalhão de
goblins. Eu nunca tinha visto tais criaturas horrendas antes, apenas tinha
ouvido histórias, afinal, eu sou um Escorpião e não um Caranguejo. Vocês nunca
devem ter visto um goblin antes, mas não é muito difícil de identificar um,
eles são criaturas pequenas e de corpos esguios, suas cabeças são
desproporcionais para seus corpos e suas bocas cheias de dentes afiados. A pele
deles é como de um verde lodo, são bem medrosos e fracos, quando sozinhos, é
claro, mas este é o maior problema, encontrar um goblin sozinho.
Goblins sempre causavam problemas
nas terras do Caranguejo, periodicamente. De alguma forma, aquelas coisas
conseguiam rastejar, transpondo a
Muralha em pequenas quantidades e atacando vilas pelas terras do Clã. Nós
tivemos a sorte, ou talvez o azar, de chegarmos em Wachimasu no exato momento
em que um pequeno batalhão daquelas criaturas atacou a vila.
O Leão disparou com o cavalo,
saltou do animal já puxando a espada e cortando uma das criaturas na altura do
peito magro. O guincho de dor sincronizou-se com muitos outros pelo campo de
batalha, como um coro lamentável de agonia. O sangue que escorreu daquela
ferida era grosso e negro, o Leão olhou com nojo quando viu aquela coisa fedida
e afastou-se quando se lembrou das histórias da infecção que a Mácula trazia.
Outros cinco pularam, atacando Akodo Ryuu, sua armadura suportou bem a maioria
dos ataques, mas mesmo que sua armadura protegesse daqueles golpes ainda doía
bastante. O guerreiro urrou balançando o corpo para afastar seus agressores e
olhou para o lado quando ouviu alguém gritar.
― Abaixe-se! – Akodo Ryuu ouviu
um berro atrás de si.
No momento que ele pulou para o
chão, Hida Hiato passou o machado varrendo os cinco Goblins que surravam o
companheiro. O golpe matou pelo menos três das criaturas e o cavalo cuidou dos
outros dois quando passou por cima deles em disparada. No meio do galope, o
cavalo ergueu as patadas dianteiras, derrubando o cavaleiro que bateu
violentamente as costas no chão e largou o machado. Hida Hiato viu um Goblin
maior vindo em sua direção com uma clava de madeira cheio de pontas metálicas
enferrujadas, aquele ainda estava zonzo e não conseguiria desviar.
Akodo Ryuu viu o globin indo na direção do companheiro
caído e correu para cima dele furiosamente. Ele pulou contra a criatura
quase babando, cortando o braço que segurava a arma e usou o balanço da espada
como impulso, girando os próprios calcanhares. O giro aumentou a sua força e
ele cortou, em um único movimento diagonal, o dorso daquele monstro. O sangue
pobre daquela criatura escorria viscoso pela lâmina e sujou um pouco da
armadura do Leão. Por estar com o sangue quente da batalha ele não ligou muito,
apenas correu para cima do próximo. O sangue daquelas criaturas é bastante
infeccioso, se entrar em contato com a pele você pode contrair a Mácula.
Kuni Karasu desceu do cavalo e
apontou a mão para a terra, começando a entoar algumas palavras, enquanto movia
a mão como se retirasse a energia do próprio solo. Não demorou muito para uma
energia verde começar a sair da terra e ir se concentrando na palma de sua mão.
Suas preces aos kamis continuavam, enquanto mais daquela energia ia se
acumulando na palma de sua mão, tomando a forma de uma esfera que parecia
borbulhar.
― Raio de jade! – Ele gritou,
enquanto a luz verde ficava ainda mais forte – Múltiplos alvos!
Estendendo a mão, a esfera explodiu
em diversos raios menores, passando por vários Caranguejos e atingiam
violentamente os goblins queimando suas peles, arrancando membros ou
simplesmente trespassando seus corpos, matando-os instantaneamente. O shugenja sentia
sua mão vibrar levemente, enquanto pequenos raios esmeraldas ainda saiam de sua
pele, como uma pequena descarga elétrica e começou a entoar o próximo ataque.
Pulei de cima do cavalo tirando minhas
lâminas gêmeas das bainhas e me senti como um pote de mel cercado de formigas.
Talvez por parecer o mais frágil dali, cerca de quinze daquelas criaturas me
olharam com um sorriso maligno e eu pude ver quando alguns Caranguejos me
olhavam da mesma forma. Apenas mais um dia para um Escorpião. Meus parceiros de
dança me puxaram e eu comecei a dançar, desviei da maioria dos ataques e
defleti o resto com minhas espadas, que tremiam com cada impacto que amorteciam.
Pulando por cima de um goblin, enterrei a lâmina no topo de sua cabeça,
entrando até chegar ao estômago, apertei a mão mais forte no punho da espada e tirei-a.
Vi dois goblins vindo na minha direção e
balancei a espada, jogando o sangue viscoso nos olhos deles.
O Leão notou que eu estava
cercado e correu em minha direção, mesmo que eu conseguisse esquivar de todos
ali, meu fôlego não duraria para sempre. Ataquei um goblin cego, cortando sua
cabeça e chutei a carcaça dele, derrubando outro que vinha por trás e furei sua
nuca com minha lâmina. Akodo Ryuu chegou cortando outro deles ao meio, dando um
passo para frente quando um porrete de madeira pobre explodiu em suas costas.
Por cima do ombro, vi um goblin tentando sincronizar um ataque com o outro que
vinha na minha frente, sorri, encostando as costas das espadas em meus braços e
esperei um pouco, e quando os ataques vieram, eu girei, desviando os ataques e
fazendo os dois goblins se matarem.
Dei um passo para frente e, ao
notar um raio verde vindo naquela direção, pulei para trás. Até aquele dia, eu
não sabia que Raios de Jade feriam apenas os Maculados. O raio partiu-se em vários outros menores e, como lanças, perfuraram
os corpos de vários outros goblins e vi Kuni Karasu me olhando desconfiado
quando desviei. Eu tive problemas depois daquilo, para convencê-lo que não
estava maculado, apenas não sabia que não iria me ferir.
Hida Hiato estava desarmado, mas
usava os próprios punhos para bater em alguns goblins que vinham em sua
direção, com a força de seu soco ele derrubou dois, abaixou-se para pegar seu
machado e golpeou violentamente, partindo os dois no meio, enterrando parte da
lâmina no chão. Puxou uma, depois duas vezes, mas o machado estava fortemente
preso no chão; largando ele ali, pegou um dos goblins pelo braço e o usou como
arma para jogar em outros dois que tentavam fugir. Olhando em volta, se podia
ver vários goblins tentando fugir, mas os arqueiros iam os abatendo, até que
nenhum conseguiu sair vivo daquela investida contra a vila.
Quando a luta acabou os Caranguejos
vieram e parabenizaram Hida Hiato pela forma como ele lutou. Ao Leão, eles também
agradeceram, assim como ao shugenja conosco, mas, para mim, eles apenas olharam
com desdém. Era lindo ver a gratidão nos olhos deles. Quem poderia culpa-los?
Limpei minha lâmina com um pano limpo, o joguei sobre os corpos no meio do
campo e fui me afastando para pegar meu cavalo.
― O que
fazem aqui, Irmãos? – um dos guardas aproximou-se de nós se dirigindo aos dois
Caranguejos.
― Estamos
atrás de uma mulher que vem fugida das terras da Garça – disse Hida Hiato sem
nenhuma cerimônia – Suspeitamos que ela tenha fugido para Wachimasu.
O Hida
olhou para um dos seus colegas e perguntou se alguma mulher havia chegado nas últimas
horas. O outro Caranguejo parou para pensar um pouco e logo pareceu lembrar-se
que uma mulher havia chegado às pressas, entretanto, não sabe para onde ela
foi, mas se fosse ficar na vila, ela iria certamente passar a noite na pousada.
O guarda
nos avisou que deveríamos nos encontrar com Hida Samano se quiséssemos ficar em
sua vila. Hida Hiato concordou com aquilo. Como ele havia servido algum tempo
na muralha, ele sabia que tipo de temperamento Hida Samano tinha, e nós, que
nunca encontramos o homem, iríamos descobrir em pouco tempo.
Entramos na
cidade e logo notei que ela era completamente diferente de Tochigi; esta vila
era bem maior que a outra, mas diferente da vila da Garça, essa foi construída
para funcionar e não para ser bonita. Não
haviam decorações pelas casas nem pelas ruas como havia em Tochigi, não haviam árvores,
muito menos cerejeiras dando um ar de graça à vila. Aquele lugar parecia mais
um enorme posto militar do que uma vila.
Muitas das
construções foram atacadas durante o conflito e algumas sofreram perdas muito
maiores que outras, mas a população já estava começando o concerto. Algo que me
chamou a atenção era que mesmo a população parecia funcional. As mulheres não
tinham cabelos muito longos, não havia vaidade nelas como nas mulheres da Garça.
Os homens, em sua grande maioria, tinham os cabelos raspados. Vários prédios
pareciam já terem sido reconstruídos várias vezes, e com um olhar podia-se
notar que os ataques aconteciam com alguma frequência.
Os aldeões
estavam obviamente tristes com suas perdas, tanto materiais quanto seus
familiares. Alguns heimins foram mortos durante o ataque e vários pedaços de
madeira foram levados para o lado de fora da Vila, para construir uma fogueira
onde iriam queimar os corpos dos goblins, várias carroças foram paradas e
alguns homens sujos foram recolhendo os corpos dos humanos mortos; as pessoas
que recolhiam os corpos eram etas, seres muito inferiores que os hiemins, eles
eram os responsáveis pelos trabalhos mais sujos do Império, tratar os mortos
era um desses trabalhos. Ninguém, a não ser os etas, tocariam em carne morta,
pois isso era um ato impuro para qualquer um.
Dois
Guardas foram nos escoltando até uma construção que parecia ser o QG, ali nós
encontraríamos Hida Samano e toda a cortesia que deveríamos esperar de um
anfitrião. Na porta, dois guardas revistaram nossos papéis de viagem e nos
acompanharam até a sala aonde Samano estaria. Nossas armas não foram recolhidas
quando entramos para falar com Samano, portar armas não significava poder
usá-las e os guardas ficaram conosco o tempo todo para nos impedir de atentar
contra a vida do daimiô. Como hoje parecia ser um dia especial, já que havia um
Escorpião entre os visitantes, dois guardas a mais foram mandados para ficar
juntos a mim.
Era um
grande alívio saber que eu teria dois guarda-costas comigo naquele momento, eu
quase podia me sentir mais seguro. Olhei para os dois e dei um sorriso quando
entramos na sala. Fomos recebidos da forma mais cortês possível, de uma maneira
que apenas um daimiô do Caranguejo poderia oferecer.
― Então
vocês são os filhos da puta que aquele desgraçado de Doji Haruki mandou para
encher-me o saco! – Samano-dono rosnou para nós assim que colocamos o pé dentro
de sua sala.