Nota do Autor:
Eu gostaria antes de mais nada pedir desculpas para aquelas pessoas que estavam acompanhando as minhas postagens. Eu tinha uma frequência e acabei quebrando ela por motivos pessoas. Eu iniciei meu processo para terminar a faculdade e isso acabou balançando meu Emocional, fiquei com um bloqueio mental e não estava conseguindo escrever até que essa semana um lapso aconteceu e eu consegui escrever alguma coisa. Espero que eu não tenha deixando nenhum dos meus leitores com raiva de mim. Eu escrevo pra mim mesmo, mas tendo vocês em mente. Sem leitores eu não tenho porque continuar postando. Gostaria de pedir que continuem me dando suporte se for possível. Eu pretendo voltar a postar com a mesma frequência já que o bloqueio mental parece ter sido perfura. Agradeço a todos desde já e desejo a todos uma boa Leitura.
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― Ichijou-sama? – ouvi uma delicada voz perfurando através do manto de horror.
Um
arrepio percorreu todo o meu corpo enquanto aquela suave voz reverberava por
todo o meu ser, livrando-me de meus temores. Já não percebia nenhuma das
sensações que tinha me deixado inquieto. O vento já não era tão gelado e os
rangidos já não aconteciam mais. O cheiro podre fora substituído por um
delicioso e suave aroma de flores.
―
Quem está ai? - perguntei calmamente.
―
Aiko, meu senhor – ela falou de forma afável - Asuka-sama pediu que eu o
acompanhasse por esta noite.
Aiko
era uma doce jovem esforçada e talvez uma das gueixas mais requisitadas da
casa. Ela era uma das poucas gueixas que tinha uma habilidade musical digna de
uma Okyia de uma cidade maior; como Ryoko Owari. Ela seria uma boa adição à
Canção dos beija-flores, depois que estivesse em posse de meu pai. Claro que eu
achava um exagero de Asuka-san quando ela me falou do suposto talento daquela
menina, mas depois de ouvi-la tocar fiquei admirado com sua performance.
De
fato, aquela menina merecia uma oportunidade que infelizmente até aquele dia
ainda não lhe tinha chegado. Talvez meu pai tenha ignorado os apelos de
Asuka-san ao falar daquela menina, mas agora que eu estava aqui as coisas
poderiam mudar para ela. Sua música e sua voz eram de fato dignas de estarem em
um lugar melhor que aquele. Não estou, de forma alguma, desmerecendo o trabalho
de Asuka-san em gerir aquela Okyia, era fato que a Mãe tinha feito um trabalho
maravilhoso, levando em consideração o estado atual daquela vila, mas a menina
merecia coisa melhor.
Restava
saber a sua aparência. Entenda que não quero desmerecer as pessoas feias, mas
sejamos sinceros. Você iria até uma Okyia que tivesse gueixas feias? Certamente
que não, e eu também não iria. Claro que com o trabalho de uma boa maquiadora
poderia esconder a falta de simetria de um rosto, mas colocar gueixas e Hokans
bonitos seria muito melhor. Seria muito trabalhoso e o gasto excessivo poderia
não dar um retorno tão grande para a Okiya. É claro que eu confiava no trabalho
de Asuka-san, ela não é nenhuma novata no ramo, mas eu precisava de algo além
de fé para basear-me ou eu cometeria erros irreparáveis.
Mesmo
que eu usasse minha visão agora, eu não teria uma visão tão clara do rosto dela;
eu precisava de uma opinião imparcial sobre o assunto. Para a minha sorte, eu
tinha alguém junto a mim que poderia ajudar-me a ter certeza. Pedi que Mayuu
fosse chamada ao meu quarto e que viesse assim que estivesse confortável de
fazê-lo. O jantar então foi servido, duas outras servas da casa trouxeram-me um
prato digno de uma Okiya de primeira classe. Sushi. Sinceramente, eu fui pego
de surpresa. Não esperava haver um artista naquele lugar.
Qual
o problema jovem? Ah, você acha estranho eu ter chamado um “cozinheiro” de
sushi de artista? Bem, não é mentira, afinal fazer sushi é uma Arte que envolve
uma técnica que não é para qualquer um. Dominá-la exige uma quantidade boa de
talento e determinação, e não são todos que são aceitos pelo sensei que ensina
as técnicas. Por isso, fiquei surpreso em encontrar um Artista nessa pequena
vila. Obviamente que não é porque ele conseguiu dominar a técnica que seu sushi
seja bom, tudo envolve habilidade pessoal; por isso falei que é necessário
talento além de determinação.
Caso
você já tenha comido sushi em vários lugares você deve notar a diferença entre
eles. Comida não é sempre a mesma, chefes diferentes fazem comida diferente
mesmo que a receita seja a mesma. Uma boa comida depende, além de ingredientes de
qualidade, um chefe de qualidade, habilidoso e rígido em seus fundamentos. Rígido
para oferecer o mínimo de qualidade às pessoas que comerão seus pratos e não no
próprio aprendizado. Cozinhar é uma Arte, assim afirma Kaito, meu cunhado. Para
ele, a Arte deve estar sempre em constante aperfeiçoamento e um chefe jamais
deve pensar que chegou em seu limite, pois quando pensar assim sua comida
perderá o sabor.
O
sabor daquela refeição era razoável, nada surpreendente como um todo. Posso, no
entanto, falar do acompanhamento; uma bebida bem incomum para meu paladar. Era
alcoólico, o que me fez gostar um pouco mais dela, mas tinha um sabor
totalmente novo. Era feito de morango e se eu não me engano o nome era “Vinho”.
Confesso que foi um nome estranho para mim, mas a doçura dele fez a estranheza
passar. Era diferente de saquê, seu gosto era muito mais suave e doce, o que
equilibrava muito bem com o sushi que eu estava comendo.
Claro
que parando para analisar isso só acontecia porque o sushi daquela noite havia
sido feito especialmente para ser apreciado com aquele sabor. Essa combinação
deixava o gosto da comida muito melhor. A música também ajudou muito naquele momento;
pelo menos naquele instante eu consegui esquecer completamente o sentimento
desconfortante que estava martelando na minha mente.
Eu
não conseguia explicar o que tinha sentido alguns momentos antes, quando eu
estava sozinho naquele quarto. Pareceu muito real para ser apenas um sonho
acordado. Talvez fosse melhor esquecer, mas de alguma forma, bem lá no fundo,
eu sabia que não seria possível simplesmente esquecer. Eu precisava saber o que
estava acontecendo, pois aquilo poderia ser o que estava afetando toda a vila.
De alguma forma eu podia sentir que havia algo por trás de tudo aquilo; algo ou
alguém puxando as cortas daquilo que estava consumindo a vila em uma valsa
degradante de peste e loucura.
Loucura,
pois, se o que aconteceu comigo aconteceu com pessoas comuns, aquelas pessoas
já não estariam completamente sãs. Se eu que sou alguém treinado ainda estou
abalado com o que aconteceu, eu temo pelas pessoas mais fracas de espírito que
passaram pelo mesmo. Em meio aos meus pensamentos, a música continuou me
forçando a esquecer aquilo que me afligia. Cheguei, por um momento, o que para
mim foi mais que o bastante, a relaxar.
Mayuu
entrou no quarto algum tempo depois que eu já havia terminado de jantar. Ela
parecia levemente aborrecida por estar sendo incomodada àquela hora por mim,
mas não falou nada. Ela já havia comido antes de vir até mim; precisava dar-lhe
alguma coisa para desculpar-me pelo inconveniente. Quando apresentei meu pedido
Mayuu ficou inicialmente em choque e depois, apenas por um segundo eu notei uma
pequena irritação em sua voz; talvez fosse minha imaginação.
Ela
comentou que a menina em questão era bela o bastante ao seu ver. Ela tinha o
rosto um pouco redondo, mas nada que iria afetar desde que o problema fosse
resolvido. Seus olhos eram bonitos e pareciam duas pérolas negras. Seu nariz
era levemente fino e arrebitado. O sorriso que ela fazia ao cantar iluminava
bem o seu rosto, demonstrando o quanto era apaixonada por aquilo, e por ter
lábios tão finos e delicados o seu sorriso era o que fazia toda a sua beleza
aflorar.
Fiquei
impressionado com os comentários de Mayuu, ela tinha pegado em pontos bem
específicos para uma boa descrição; ela pareceu-me forçada a fazer isso, é
claro. Devo desculpar-me com ela pelo inconveniente assim que possível, preciso
descobrir que tipo de cosias ela gosta para poder aproximar-me com um devido
pedido de desculpas. Isso é o mínimo aceitável. Pedi que minha sobrinha me
acompanhasse um pouco mais antes de nos separarmos para dormir. Amanhã o dia
seria longo e precisaríamos de um bom descanso para aguentar o próximo dia.
Perguntei o que ela tinha achado à primeira vista da cidade e aparentemente sua
visão geral não era tão diferente da minha, o que é claro, foi um alívio para
mim. Nada pior que descobrir que a fonte de meus receios atuais eram nada mais
que mera imaginação.
Mayuu
disse que fisicamente não havia nada de errado com a cidade. Além de vários
pequenos animais que pareciam verdadeiras pragas; nada muito alarmante, no
entanto. Ela disse ter visto morcegos voando para todos os lados, mas de alguma
forma pareciam evitar entrar aos montes na vila, além disso, pode ver pequenos
vultos rápidos como flechas entrando por pequenas brechas escuras e apertadas
das casas comuns. Havia também uma pequena quantidade de moscas passando em
alguns corredores imundos.
Claro
que sendo dito dessa forma você pode achar algo muito ruim, mas lembre-se que
aquele lugar era uma vila muito pequena no meio de um bosque. Insetos e animais
como aqueles são comuns. Claro que a sua quantidade pode vir a ser algo incômodo,
mas esse problema seria fácil de resolver.
Fora
isso a cidade era bem comum. As casas eram relativamente bem cuidadas e a
cidade no geral era bem limpa. As ruas eram bem tratadas e não havia lixo
espalhado ou jogado pelo chão. O zelo com o próprio território era algo padrão
para um senhor. Para um próprio senhor de uma casa isso era importante, pois
assim como dizia as sábias palavras de Akodo: “Uma casa é como um pedaço da
alma de um Samurai”, creio que essas palavras sejam dele, mas mesmo que não,
isso não importa; essas palavras querem dizer que você pode saber muito sobre o
senhor de um lugar tendo como base a forma como ele trata seu próprio ambiente.
Dito
isso, ainda havia algo estranho naquela cidade. Para Mayuu, assim como para
mim, aquilo era muito mais uma impressão que qualquer outra coisa, mas para a
menina aquilo parecia muito mais sério. Ela disse que ao entrar em contato com
os kamis, os pequenos deuses lhe revelaram um comportamento muito inquieto. Não
havia um motivo certo para isso, os próprios kamis não sabiam dizer porque
motivos eles estavam daquela forma, mas definitivamente havia algo ali. Uma
força desconhecida que parecia brincar com todas as coisas vivas.
Os
kamis pediram para dar um jeito naquela força, seja lá o que ela fosse, pois
mesmo que quisessem eles não poderiam interferir. Acho que entendo o que isso
quer dizer, mesmo que para você possa ser um pouco estranho. Os kamis são
forças da natureza e devem agir como tal; de fato eles poderiam estar
incomodados e poderiam querer fazer algo a respeito da situação, mas eles não
poderiam fazer sozinhos. Forças da natureza devem agir como o próprio nome diz.
Quando um shugenja pede pela intervenção dos kamis eles podem de fato
interferir na ordem natural, porque tal interferência não será definitiva.
Mesmo
os kamis mais agressivos como os kamis do fogo, que têm o poder para destruir,
não tornam sua destruição algo definitivo. Mesmo quando seu poder é invocado
para destruir uma vida. Segundo os mestres shugenjas, a vida é um grande ciclo,
aquilo que morre um dia volta a vida de uma forma completamente diferente. Isso,
é claro, não quer dizer que shugenjas devam ser usados como assassinos, pois de
certa forma essas pessoas também se tornam elementos da natureza. Seus poderes
são usados normalmente e principalmente pelo bem maior e não pelo egoísmo de
engrandecer a si mesmos.
Em
resumo, os kamis não podem interferir por eles mesmos na ordem natural, mas
podem se assim lhe for pedido por um shugenja. Os pequenos deuses detestam as
pessoas com a maldade em seu cerne, e assim vem sendo desde o início das Eras.
Você pode estar se perguntando como existem shugenjas Escorpiões, então, isso é
fácil de responder; nós não somos maus e os adoráveis kamis sabem disso.
Escorpiões fazem apenas o que é necessário, somos egoístas sim, mas nosso
egoísmo não é apenas para deixar nosso Clã mais poderoso. Nós somos a mão
oculta do Imperador, assim tem sido desde Hantei primeiro e assim será até o
dia que o Império se tornar poeira.
Você
acha que eu estou sendo muito pessimista ao dizer isso? Eu deveria dizer que
você é muito tolo ou apenas inocente demais para achar o contrário. Entenda meu
jovem, nada nesse mundo enorme e inexplorado para nossa sociedade Rokugani é
definitivo, nem mesmo a areia sobre os seus pés será sempre a mesma. Tudo é
mutável e tudo é destrutível. Algo só é indestrutível porque não foi encontrado
uma forma de ser destruído, nada mais.
Havia
um outro problema que gerou preocupação até mesmo em mim; mesmo que eu não
soubesse o quanto isso era ruim eu poderia entender que se algo assim aconteceu,
a situação não era das melhores. Os kamis pareciam cansados e fracos. Mayuu teve
que explicar o que isso significava para mim, pois como eu disse, eu não
entendia sobre o assunto. Normalmente os kamis estariam dessa forma por dois
motivos e um não excluía o outro, apenas piorava o problema.
O
primeiro motivo seria a utilização de uma Prece muito poderosa. Feitiços tão
poderosos que poderiam ser capazes de abalar a estrutura da realidade. Mayuu já
havia estudado um feitiço como esse antes; obviamente ela não sabia usar tal
feitiço, mas conhecer é uma ótima maneira de aprender. Quando a Prece correta
era feita, uma rajada descomunal de fogo seria liberada contra o alvo e
dificilmente alguma coisa viva poderia suportar tamanho poder. Depois que o
feitiço fosse lançado, os kamis de fogo ficariam muito agitados por algum
tempo; fontes de fogo como fogueiras ou tochas ficariam mais agressivas, mas
depois de um tempo os kamis ficariam exauridos e não teriam forças para
auxiliar novamente por um curto espaço de tempo.
O
segundo motivo seria, assim como o primeiro, uma influência externa aos
próprios kamis, mas algo muito pior dessa vez. Seria a interferência da mácula.
Não é que a mácula enfraqueça os kamis, mas o conjunto dela faz isso. Nas
terras sombrias, como os Caranguejos costumam chamar, os kamis estão a todo
tempo exauridos e são muito mais raros, pois os pequenos deuses evitam aquele
lugar maldito. A corrupção daquelas terras enoja os kamis e as pessoas que são
influenciadas por tais forças malignas são evitadas por eles.
Infelizmente,
nenhum desses dois motivos pareciam encaixar bem. Não havia, entretanto,
segundo Mayuu, a mesma sensação naquela vila que as terras sombrias passavam.
Ela não havia como explicar de uma forma para alguém que nunca pisou naquele
lugar pudesse entender, e preferi não a forçar a isto. Além do que, não havia
nenhum boato sobre um acontecimento tão estranho, nessa área, quanto um pilar
de fogo destruindo alguma coisa, esse tipo de história voaria pelas terras
Escorpiãs facilmente.
Mayuu
expressou sua preocupação com aquele pedido dos kamis; ela entendia o motivo,
mas não havia como ajudar. Os kamis do vento não lhe sussurram nada que pudesse
parecer errado, e mesmo os kamis da terra estavam incertos. Tudo que ambos
diziam com convicção era que as pessoas naquele lugar estavam sofrendo muito
mais do que poderiam suportar, e que logo não haveria mais quem pudesse
suportar o que quer que fosse.
Aquelas
palavras martelaram em minha cabeça pelo resto da noite. Fui dormir preocupado
primeiro com a nossa própria segurança e com a de todos os que estavam
envolvidos. Resolvi resguardar-me com o que eu tinha sentido antes, não deveria
estar preocupando alguém tão jovem, além do que ela já estava. Mayuu ainda era
apenas uma criança e me doía a envolver em algo tão perigoso como o que eu
tinha nas mãos. Talvez fosse melhor eu a enviar de volta para casa para a
manter segura, mas eu sei que ela não iria aceitar de bom grado.
Seria
um tapa na cara de meu pai também. Mayuu havia sido enviada com um propósito.
Envia-la de volta para casa naquele momento seria uma vergonha para o meu pai.
Bem, eu devo admitir que fazê-lo passar vergonha quase me fez continuar seguindo
esse meu desejo, mas eu decidi que precisava de Mayuu ali. Eu não era um
shugenja, e o auxílio de um invocador de deuses poderia vir muito a calhar
quando o momento pedisse.
Na
manhã seguinte, fui acordado por passos vindo na direção de meu quarto. Verifiquei
se minha espada ainda estava ao meu lado, no lugar em que eu havia a colocado
na noite anterior e isso encheu-me de alívio. Uma voz suave veio do outro lado
da parede de papel; Asuka-san acordou-me pedindo desculpas e disse que algumas
pessoas vieram convidar-me a ter com a chefe da vila. Preparei-me para sair,
por precaução eu levei todas as minhas ferramentas e deixei o resto de minha
bagagem na Pétalas dançantes.
Mayuu
demorou um pouco mais para aparecer no hall de entrada, aonde haviam dois guardas
esperando por nós. Foi dito que Sayo-san havia ficado ciente de nossa chegada
na noite anterior, mas que preferiu não nos convocar por achar que estaríamos
cansados da viagem. Os guardas foram muito desdenhosos com nossa presença, mas
absteram-se de fazer qualquer tipo de comentário que poderiam coloca-los em
maus lençóis. Eu estava ali como um Magistrado, afinal minha posição social
estava muito mais alta que a deles e um comentário errado poderia complicá-los.
A
vila não era tão movimentada quanto eu achei que seria. Ruma era conhecida na
região como um ponto para as mulheres, onde poderiam comprar boas maquiagens,
para o uso diário, e pelos bons perfumes que eram produzidos aqui. A vila, no
entanto, mesmo durante o dia, era meio morta. Havia um ou outro heimin
transportando caixas ou limpando as ruas, mas fora isso tudo era pacífico, pacífico
demais, até.
Os
guardas levaram Mayuu e eu até a mansão da chefe da vila. A casa ficava à
alguns metros da hospedaria, não demoramos muito para chegar. Havia uma brisa
agradável vindo naquela direção. Não havia notado tal brisa na noite anterior,
pois o próprio ar pareceu-me meio morto naquele momento. Talvez com os sentidos
sendo tão estimulados pela estranheza que o lugar passa, fizeram uma brisa tão
deliciosa passar despercebida.
O
vento trazia consigo o frescor e aroma de diversos tipos de flores. Era um
cheiro doce e suave de uma mescla única de vários tipos de flores que junto à
umidade daquele pequeno e límpido lado, por trás da mansão, davam um sabor único
ao vento. Próximo à mansão não haviam casas nem construções, e talvez por esse
motivo o ar aqui corria de forma mais natural. Era como um pequeno campo
aberto. Ao lado da mansão ficava um grande canteiro onde eram cultivados vários
tipos de flores. Aquelas deveriam ser usadas para criar os perfumes e as
maquiagens, que faziam dessa vila tão importante para meu pai.
A
mansão era muito simples para eu perder meu tempo detalhando como ela era. Eu
não podia esperar mais de uma pequena vila. Era bem arrumada e com bons móveis,
afinal um senhor deveria demonstrar pelo menos um pouco de dignidade quanto a
própria casa. Fomos guiados até a sala onde Sayo-san já estava nos aguardando.
Ela parecia um pouco zangada e impaciente, mas não deixou de ser cortês por
isso. Algumas pessoas deveriam aprender com aquela mulher a portar-se ou a
tratar melhor as visitas, certo?
― Bem-vindos à Ruma – ela disse no tom mais brando e caloroso que pode
– fico feliz por Soichiro-sama ter enviado alguém para tentar ajudar minha
filha.
Aquilo
não era uma mentira, mas devo dizer que algo me incomodava em sua fala. Ela
parecia bem forçada a dizer aquilo, como devo dizer, sua felicidade parecia
muito forçada, fingida. Isso não era apenas uma impressão minha, era a verdade.
Talvez a demora de resposta de meu pai tenha sido lenta? Impossível, não fazia
nem três dias que ele tinha recebido a carta pedindo por ajuda, algo não cheirava
bem nessa vila.
― Pode ser um pouco tarde para as apresentações, mas eu chamo-me
Shosuro Ichijou, filho de Shosuro Shoichiro – falei em um calmo como um sorriso
– essa ao meu lado é Soshi Mayuu, minha adorável sobrinha.
Mayuu curvou-se longamente apresentando-se para Sayo-san que parecia
ter uma barreira ao seu redor protegendo de qualquer tentativa nossa de nos
aproximarmos. Eu não poderia e nem deveria culpa-la por uma atitude tão fria de
sua parte. Uma de suas preciosas filhas estava doente com uma doença até agora
desconhecida, e só as Fortunas poderiam saber o que aquela pobre mulher estava
passando até aquele momento.
― Devo agradecer suas boas vindas, Sayo-san – disse curvando-me
levemente para ela – e desculpar-me pela demora em responder. Posso estar sendo
apressado, mas poderia levar-nos até sua filha doente?
― Não é problema nenhum – ela disse seca – mas nenhum médico pareceu
saber o que estava tentando tratar.
― Não será nenhum problema – disse com um sorriso – minha pequena
sobrinha é uma invocadora de kamis, ela deve conseguir identificar a fonte do
problema, certo, Mayuu-san?
― Não deve ser nenhum problema – Mayuu disse de uma forma muito fria,
provavelmente ela não gostava de ser tratada daquela forma.
Aquela deveria ter sido a primeira expressão boa que consegui de
Sayo-san naquele dia e talvez a última. Ela ficou verdadeiramente surpresa
quando disse que Mayuu era uma shugenja e seu coração tremeu com a notícia.
Mayuu agora era a esperança de sua filha ficar melhor e da suposta doença
deixar de ser um problema até mesmo para a Vila. Shugenjas são raros de
encontrar no império, não é qualquer um que consegue ter afinidade para as
técnicas envolvidas, mas sua raridade são uma prova de quão incríveis são estas
pessoas.
― Devo escrever uma carta para Soichiro-sama agradecendo por tamanha
consideração – ela disse curvando-se e poderia até haver uma menção de lágrima
no canto de seus olhos – agradeço também à pequena shugenja por dignar-se a
prestar tamanho favor para minha família.
― Pare, não há motivos para agradecer ainda – Mayuu disse com a voz trêmula
– salvar pessoas que precisam deve ser algo natural para um Samurai.
Realmente, salvar aqueles que precisam é o básico, afinal Jin,
Compaixão, do bushido é algo que todo Samurai deve ter. Teoricamente todo
Samurai e todo Clã se presta aplica a Compaixão. Os Escorpiões, pode ser uma
surpresa para você, é um dos Clãs que o aplicam, afinal àqueles inferiores
sempre têm suas utilidades. Creio que o Clã que realmente é compassivo porque é
de sua natureza seja o Clã Fênix; é tido que a Fênix ensina o Tao Shinsei para
os de menor posição social, pois eles acreditam que a proteção espiritual, que
o Tao oferece, é tão importante quanto a proteção física.
― Suas palavras são reconfortantes, jovem senhorita – Sayo disse curvando-se para ela – eu os guiarei até minha filha, por aqui.